domingo, 3 de outubro de 2021

Sob a sombra do Baobá

 



Gustavo José Barbosa*

            Sou da época em que o epicentro de uma etapa importante da formação escolar chegava ao fim na oitava série do primeiro grau, e os dias que antecediam o mês de dezembro era de tomada de decisões sobre o futuro acadêmico dos colegas estudantes. Na minha turma de concluintes no ano de 1998 do Colégio Nossa Senhora do Carmo, em Nova Cruz (RN), alguns optaram pela formação clássica e outros pelo ensino integrado com o técnico no CEFET (hoje IFRN), Natal (RN), no Colégio Agrícola de Jundiaí (CAJ), em Macaíba (RN) e até Colégio Agrícola Vidal de Negreiros (CAVN), em Bananeiras (PB).

            Fui no embalo daqueles que optaram  pelo curso técnico no CAVN e após uma passagem meteórica pelo Brejo Paraibano, ingressei no CAJ. Dessa forma encerrava-se um ciclo na minha caminhada escolar em que foi substituído o olhar pedagógico de Francisco e Clara, pelo cabo da enxada nos roçados de Jundiaí com foco na formação profissional.

            Chegando à Jundiaí, verifiquei assim como um arqueólogo em busca de peças importantes, que por ali haviam passado muitos novacruzenses desde o ano de 1949 cujos nomes estavam gravados não apenas nas placas das turmas, mas nas paredes dos alojamentos, nas camas onde dormíamos e na memória do lugar. Desta forma percebi que assim como Ló foi instruído pelo anjo a não olhar para trás quando saía de Sodoma e Gomorra, eu deveria fazer o mesmo e progredir naquela jornada de formação humana.

            Certa feita naqueles primeiros dias na Escola, visitei a cooperativa dos alunos e chegou em minhas mãos o livro “Jundiaí no seu cinquentenário”, de Rivaldo D´Oliveira, cuja dedicatória mereceu minha atenção pelo teor familiar: “à memória de meu pai Fenelon, exemplo de honradez e à minha mãe Ana pela ternura que sempre irradiava para os seus filhos”. Confesso que li o obra com objetivo de conhecer a história da instituição escolar que ingressei e não suspeitava nos primeiros suspiros, que o autor, assim como eu,  também é novacruzense.

            Numa tarde quente de sexta-feira por ocasião de uma irradiante aula de matemática, eis que surgiu na porta da sala-de-aula o autor daquele livro que eu havia devorado com afinco em pouco tempo. Após cumprimentar o mestre Evilásio Paiva de Araújo que nos brindava com suas explicações aritméticas, o professor Rivaldo D´Oliveira perguntou à plateia se ali havia alguém de Nova Cruz, e logo levantei a mão manifestando que sim.

            Penso que aquele ato do professor Rivaldo de identificar seus conterrâneos repetiu-se por mais de meio século, pois nesse gesto havia a confluência do sentimento de pertença à cidade onde nascemos e daquele novo lar que nos adotara como filhos. O Sr. Fenelon D´Oliveira foi um importante comerciante em solo novacruzense e homem dotado de grandes iniciativas culturais na nossa cidade, e seu filho conseguiu sintetizar esse exemplo paterno até o fim dos seus dias no apreço que tinha por sua Jundiaí e por todos que por ali passaram.

            O Baobá (Adosonia digitata L.) é uma árvore de grande porte presente em poucos lugares do nosso país, e segundo a tradição oral foi plantada em Jundiaí por escravos que trouxeram a semente da África naqueles tempos sombrios. Foi sob a sombra dela que muitas gerações passaram seus dias e ali cultivaram seus projetos de cunho profissional e em outros aspectos das suas vidas.

            Já faz quase uma década que o professor Rivaldo D´Oliveira partiu para a eternidade, todavia o seu exemplo de vida permanece vivo na memória de todos que conviveram com ele em Jundiaí, sentimento este que pode ser comparado ao conforto que sentíamos junto ao Baobá. Que a memória deste ilustre professor possa estar sempre presente entre os novacruzenses e por todos aqueles que cultivam o apreço pela educação, em particular pelo ensino técnico agrícola do nosso país.

 

 * Gustavo José Barbosa é técnico agrícola e novacruzense. E-mail: gustavoufpb@outlook.com
Fonte: https://marcozeronewss.blogspot.com/


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