quarta-feira, 25 de julho de 2018

Homens de toga não irão temer em adiar as eleições

Ricardo Stuckert
O quadro eleitoral brasileiro começa a ser desenhado, mas o pleito continua indefinido. Apesar da escolha de alguns candidatos, nos últimos dias, para a Presidência da República, ninguém se arrisca a fazer qualquer prognóstico porque tudo depende da candidatura de Lula. Com Lula o panorama tem uma cara e sem ele tem outra, mas nenhuma delas agrada aos atuais donos do poder, porque em qualquer dos cenários o candidato que representa o golpe, as forças que controlam o Executivo, Legislativo e Judiciário, além da mídia, não parece ter qualquer chance de ser eleito, mesmo contando com o maior tempo de propaganda eleitoral na TV: Geraldo Alckmin. O ex-governador paulista praticamente não sai dos últimos lugares, segundo as pesquisas de intenção de votos, mesmo diante da dúvida sobre o registro da candidatura do líder petista. E não há perspectiva de crescimento, apesar da ótica de alguns comentaristas de que ele tende a se fortalecer com a união da direita. Ao contrário, com as investigações sobre os desvios de recursos do Rodoanel chegando muito próximos dele, levando à prisão alguns de seus homens de confiança, as perspectivas para ele estão ficando mais sombrias.
Na verdade, quem depois de Alckmin tem mais afinidades com os donos do poder e mais chances de chegar ao Palácio do Planalto, também em qualquer cenário com Lula ou sem ele, é o ex-capitão Jair Bolsonaro, o segundo colocado em todas as pesquisas. O admirador do coronel Ustra pode ser uma alternativa para os golpistas, mas não tem a confiança deles, o que o deixa numa situação não muito confortável para manter a sua política. Alckmin já se comprometeu a dar prosseguimento ao programa de Temer, incluindo as privatizações e manutenção da reforma trabalhista, enquanto Bolsonaro tem permanecido discreto quanto às ações do atual governo. No panorama desenhado até agora acredita-se que o segundo turno será disputado por Bolsonaro e Lula ou quem ele indicar, perspectiva nada animadora para os atuais donos do poder. Diante disso, será que eles se arriscarão a perder o poder numa eleição que lhes parece desfavorável sob todos os aspectos? Ao que tudo indica já estão avaliando as vantagens e desvantagens do pleito e se chegarem à conclusão que é melhor adiar a consulta popular não há dúvida de que encontrarão um meio de fazê-lo.
Para isso contam com o apoio da mídia, particularmente da Globo, que sequer admite a possibilidade do PT vencer as eleições de novo. Obviamente terão também o apoio do Congresso, que pode sofrer uma ampla renovação, com a não reeleição da sua grande maioria, marcada pela aprovação do impeachment da presidenta Dilma Rousseff e das medidas deletérias de Temer, em especial a reforma trabalhista. E igualmente contarão com o apoio do Judiciário, que não apenas endossou o golpe, ignorando a Constituição, como, também, a prisão de Lula, rejeitando todos os recursos da sua defesa mesmo consciente da armação para impedi-lo de concorrer ao Planalto. Tem-se a impressão de que agora mais do que antes, depois do programa de governo do PT que prevê uma reforma do Judiciário, os homens de toga estarão mais abertos a qualquer medida que promova o adiamento das eleições, porque isso beneficiará a todos, menos, certamente, ao povo brasileiro, que continuará massacrado por um governo sem compromisso com os interesses nacionais.
Entre os candidatos até agora conhecidos, o que mais perdeu com as movimentações partidarias foi o ex-ministro Ciro Gomes que, apesar de politico experiente, cometeu talvez o seu maior erro ao imaginar que a eliminação de Lula do páreo sucessório seria a sua maior garantia para chegar ao Planalto. Por isso hostilizou o PT com críticas inoportunas e desnecessárias e, pior, em nenhum momento defendeu Lula da perseguição judiciária da qual foi vítima. Muito pelo contrário, chegou a aprovar a sua prisão, declarando enfaticamente que ele estava fora do pleito. Com esse comportamento, até certo ponto infantil, distanciou-se dos petistas e perdeu a sua maior oportunidade para chegar à Presidência da República, pois seria o mais provável substituto de Lula, no caso dele ser impedido de concorrer, além de herdeiro natural dos seus votos. Ele achou que poderia contar com outros partidos da esquerda e, mostrando-se confiante, chegou a esnobar o PT dizendo que no segundo turno teria de graça o seu apoio. A certa altura buscou até aliar-se ao chamado Centrão, contrariando seu comportamento esquerdista, mas decepcionou-se ao ser preterido por Alckmin e, então, começou a fazer acenos para os petistas, buscando uma reaproximação.
Alguns comentaristas admiradores de Ciro tentam pressionar o PT para que o aceitem e já houve até quem o visse como vice de Lula, no que denominou de "chapa dos sonhos", mas o ex-ministro, que já tentou aliança com vários partidos, não ajuda muito. Agora tentam forçar Lula a indicar logo o vice ou o seu substituto, acusando o ex-presidente de rachar a esquerda e favorecer a eleição de Alckmin por insistir em sua candidatura. Querem pressioná-lo para colocar logo em execução o chamado plano B, sem atentar para as suas consequências na situação de prisioneiro do ex-presidente. Se Lula admitir agora, antes de esgotados todos os recursos, a sua inelegibilidade estará admitindo a sua culpa. E o seu indicado sofrerá, antes do tempo, o bombardeio dos seus adversários, especialmente da mídia. Ele não precisa ter pressa. Deve esperar até o último minuto dos prazos legais para o registro da sua candidatura, só então indicando o substituto caso não consiga transpor a barreira levantada pelo Judiciário. Até lá não apenas o PT mas a esquerda, como um todo, deve lutar pela sua liberdade e pela sua candidatura.
Fonte: www.brasil247.com

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