Longe dos holofotes, a Comissão Mista do Orçamento aprovou na manhã desta quinta (14) o texto base do projeto de Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO) de 2017. Além de dar aval ao deficit primário de R$ 139 bilhões para o ano que vem, a matéria incorpora mecanismo que limita o crescimento dos gastos públicos à inflação do ano anterior. De certa maneira, a medida antecipa e materializa efeitos da Proposta de Emenda Constitucional (PEC) 241, sinalizando cortes em políticas sociais.
Os destaques da lei serão apreciados apenas no dia 2 de agosto. E, depois disso, o projeto terá que passar ainda por votação em plenário, em sessão conjunta da Câmara e do Senado.
De acordo com aespecialista em orçamento público e assessora do Instituto de Estudos Socioeconômicos (Inesc), Grazielle David, o relatório atinge diretamente a população, uma vez que o teto para o crescimento das despesas deve significar menos verbas para gastos sociais.
O texto aprovado na comissão estabelece um teto para as despesas primárias da União em 2017, limitadas aos gastos desse ano, incluindo os restos a pagar, atualizadas pelo índice oficial de inflação (IPCA). Ou seja, nada de crescimento real de despesas.
A ideia é a mesma contida na PEC 241, que já tramita no Congresso, e tem sido criticada por impedir a destinação de mais verbas para áreas hoje subfinanciadas, ao mesmo tempo em que preserva os recursos destinados ao pagamento de juros da dívida pública. Ou seja, trata-se de cortar a parte do Orçamento que beneficia a maior parcela da população, de forma a garantir recursos destinados a rentistas.
Para Grazielle, o texto da LDO incorpora a essência da PEC 241 e antecipa seus efeitos, embora preserve áreas como saúde e educação, que só poderiam ser afetadas mediante mudanças na Constituição – daí a necessidade de apresentar a PEC. De acordo com ela, na lei aprovada na comissão, o governo foi obrigado então a fazer ressalvas, de forma a não torná-la inconstitucional.
“Para não tornar a LDO inconstitucional, ele [o governo] faz algumas ressalvas. Escreve lá que não vai entrar nesse limite dos gastos as transferências constitucionais obrigatórias, os fundos de participação de estados e municípios e as vinculações constitucionais garantidas por lei. Ou seja, saúde e educação então não vão entrar nesse teto da LDO de 2017, porque a Constituição não permite”, detalha Grazielle.
Segundo ela, contudo, caso a LDO seja mesmo aprovada, todas as outras despesas sociais passarão a ser limitadas pela variação da inflação, o que deve atingir em cheio, especialmente, o orçamento da previdência e de benefícios sociais - como auxílio doença e seguro desemprego.
“Todas as demais políticas públicas estão extremamente ameaçadas, especialmente previdência e benefícios sociais. Primeiro porque esses já são os alvos do governo; segundo porque, se não vão poder cortar na educação e na saúde, o corte será ainda maior no resto, em todas as demais políticas públicas que não têm vinculação por lei, como aquelas voltadas ao desenvolvimento agrário, por exemplo. Tudo isso vai poder sofrer corte”, previu.
De acordo com a assessora do Inesc, aprovar a mudança na LDO significará “o pontapé inicial” para a PEC 214. “É uma forma de materializar e antecipar a sua proposta, mas dentro da Constituição, fazendo essas ressalvas, até que a PEC em si seja aprovada”, critica.
Grazielle avalia que a proposta é ruim por alterar a concepção de Estado e sociedade contida na Carta Magna, tirando o foco das necessidades do cidadão. “Enquanto a Constituição prevê hoje um Estado que tem como valor maior o cidadão e a garantia de um Estado de segurança e bem-estar social, essa PEC vem e fala: ‘não, o objetivo maior do Estado não é esse, é realizar superavit primário’”, condena.
Ela alerta que o resultado dessa mudança é que, ao invés de o orçamento existir para financiar políticas públicas que garantem direitos e promovem esse Estado de bem-estar social, “a gente passa a ter um orçamento com um propósito apenas fiscal, de fazer superavit e pagar de juros e compromissos fiscais”.
A especialista em orçamento público ainda chama a atenção para a forma com que este projeto tramita no Congresso. “Houve uma manobra nesse processo”, denuncia, destacando que a votação da LDO estava agendada para a noite de quarta (13), mas terminou sendo cancelada. Segundo ela, no site da Câmara, até tarde da noite, a única atividade da Comissão agendada antes do recesso era uma audiência com o ministro da Saúde. A votação do projeto, contudo, foi reagendada para a manhã desta quinta.
“Essas manobras são muito ruins, porque inviabilizam dois princípios extremamente importantes: a transparência do processo legislativo e a participação social. Se as coisas são decididas da noite para o dia, isso inviabiliza totalmente a participação popular, e logo de uma coisa tão importante como essa, que é a votação de uma lei orçamentária de amplo interesse social”, opinou.
Sem CPMF
O texto anterior da LDO, apresentado pela equipe da presidenta eleita Dilma Rousseff, previa a possibilidade de um deficit de R$ 65 bilhões para a União em 2017. Ou seja, a atual gestão interina mais que dobrou esse valor.
O relator da Lei, Wellington Fagundes (PR-MT) incluiu no relatório a vedação à incorporação no orçamento de 2017 de receitas vindas de tributos que ainda não foram aprovados pelo Legislativo.
Nesse sentido, fica excluída a possibilidade de uso no orçamento da Contribuição Provisória sobre Movimentação Financeira (CPMF), no caso de recriação do tributo.
“Isso deixa claro que o governo não poderá, ao enviar ao relator a peça orçamentária, usar de nenhum imposto que não tenha sido aprovado pelo Congresso. Está extirpada, para o Orçamento do ano que vem, a possibilidade de CPMF”, disse o senador.
Fonte; Portal Vermelho
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