terça-feira, 29 de setembro de 2015

Pesquisador potiguar quer provar a existência do divino


Francisco de Assis Mariano

Quando questionado sobre a existência de Deus, em 1928, o filósofo inglês Bertrand Russell afirmou que é dever de todo praticante de alguma religião evidenciar a presença da entidade divina. Ele defendia que o ônus da prova é responsabilidade de quem acredita, e não o contrário. Quase nove décadas depois, na cidade de Nova Cruz, na região Agreste do Rio Grande do Norte, o pesquisador Francisco de Assis Mariano, 22, deseja provar a existência de Deus através da análise de valores e deveres morais, tema da tese de seu mestrado.
O esboço produzido pelo jovem potiguar foi aceito, em 20 de agosto, pela banca do mestrado em Filosofia da Universidade Federal da Paraíba (UFPB). A partir daí, ele vai passar os próximos dois anos construindo a dissertação “Argumento Moral a favor da Existência de Deus”, que tem por objetivo responder ao mais básico questionamento humano: Deus existe? 
O novacruzense tem graduação em Relações Internacionais pela Universidade Potiguar (UNP), mas sempre se interessou por filosofia analítica, o ramo do pensamento que permeia o estudo da lógica e da linguística. “Eu quero aprimorar os conhecimentos sobre política, ética e religião. Eu já estudava isso como interesse pessoal, mas foi apenas no ano passado que decidi seguir a carreira acadêmica”, conta.
Ele explica que a existência lógica de Deus foi escolhida por ser um tema pouco explorado nas cátedras de filosofia. “É um assunto que já ganhou poder em países de língua inglesa, mas quase não há centros de excelência no Brasil que levem o assunto a sério”, diz.
Evangélico, ele frequenta os bancos da Igreja Batista Regular, mas deixa claro que a pesquisa não se louva em princípios cristãos. “O Deus que eu pesquiso no projeto não é particular ao cristianismo. É apenas uma concepção geral; podendo se encaixar com qualquer religião que tenha um Deus pessoal”, reforça.
A tese argumenta que Deus é a fundamentação básica para moralidade humana. De maneira sintática, a defesa é de que os atributos encerrados na natureza divina, como justiça, bondade e equidade, por exemplo, são bases para a moralidade humana.
O estudo foi influenciada pela leitura, ainda nos bancos da igreja, dos textos de Tomás de Aquino e Immanuel Kant. Assis detalha que os dois filósofos trazem teses semelhantes sobre a essência divina: os valores e deveres morais objetivos são frutos da existência de um agente moral externo e absoluto, ou seja, Deus. 
Apesar da fé inabalável, o árido tema já lhe tirou alguns dias de sono. Ele diz que já pensou na hipótese de não confirmar a existência divina. Para evitar surpresas desagradáveis, quer encerrar as dúvidas com a análise epistemológica – estudo sobre origem, a estrutura, os métodos e a validade do conhecimento – do divino. “É algo totalmente racional. Deus não precisa de argumentos”, justifica.
Segundo ele, a crença não necessita de provas. O mestrando pontua que esta é uma “crença básica” e que argumentos servem apenas para reforçar o crédito. “Fiz um argumento para a existência de Deus, mas não é algo necessário crer. A crença básica é tudo aquilo que não podemos provar, mas que é racional”, detalha. 
Assunto ainda é pouco pesquisado no Brasil
O mestrando conta que a “análise” de Deus está começando a ganhar atenção da classe acadêmica brasileira. Há poucas bases de pesquisa e ínfimos são os eventos científicos relacionados ao tema. No Nordeste, por sinal, apenas a Universidade Federal da Paraíba tem realizado ações de incentivo à pesquisa e produção de artigos científicos sobre o assunto.
O jovem pesquisador também afirma que não foi alvo de preconceitos ou enfrentou empecilhos para estudar o tema belicoso. “O único problema é que, para realizar a pesquisa, sem materiais de excelência acadêmica escritos em português, toda a minha referência bibliográfica será na língua inglesa”, detalha.
Assis Mariano afirma que o estudo da lógica da religião é pouco explorado pela ênfase dada às questões que podem ser verificadas pela ciência. A era do positivismo lógico, segundo ele, como a ética, estética, conhecimento, realidade e religião, acabou sendo deixada de lado nas últimas décadas. “Hoje, já temos grandes filósofos que defendem a existência de Deus, como Alvin Plantinga, da Universidade de Notre Dame, e Richard Swinburne, da Universidade de Oxford”, cita.
Ele conta ainda que temeu não passar para o mestrado em razão das universidades brasileiras não darem tanta atenção ao tema. Na seleção feita, com trinta vagas disponíveis, ele acabou em décimo lugar. “Não fui alvo de preconceito em nenhum momento da seleção. Nesse quesito eu admiro o Departamento de Filosofia da UFPB. Foi uma seleção completamente imparcial e transparente sem qualquer tipo de vício”, esclarece.
O jovem pesquisador não tem dúvidas que irá provar, com toda a regra científica, a existência lógica de Deus. “Dúvidas sempre existem no decorrer de uma pesquisa, mas estou tão convencido da força dos argumentos da pesquisa e no apoio do orientador como de todo o Departamento de Filosofia da UFPB, que essa pesquisa será um desafio bastante prazeroso”, reforça.
Deus: hipótese plausível
A tese de mestrado será calcada nas bases levantadas por dois estudiosos ingleses, William Sorley e Mark Linville, tendo em vista o prisma de que a presença de moralidade objetiva nos seres humanos é, por si, a evidência da existência de Deus. Desta forma, o conceito de naturalismo – a visão de que apenas existe o mundo natural e não há nada acima disso – não é verdadeiro. 
“Isso porque, se Deus não existe, a moralidade humana se reduz apenas a um produto subjetivo e ilusório da evolução biológica, um mero fator da seleção natural na busca do homem pela sobrevivência. Mas se Deus existe, temos um padrão moral objetivo, como ética e direitos, ou seja, um modelo verdadeiro independente da opinião humana. Isso requer uma base sólida, uma fundamentação que transcende a opinião humana, e, nesse caso, Deus seria a hipótese mais plausível”, complementa.
Assis Mariano espera que a tese sirva de compêndio para a defesa dos deveres morais da humanidade. “É necessário propagar amor ao próximo, justiça, compaixão, verdade e qualquer virtude que a humanidade precisa nesse tempo em que vivemos”, encerra.
Fonte: novojornal.jor.br/

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