sexta-feira, 11 de outubro de 2013

Arte do barro inspira crianças a fazer os próprios brinquedos, em Caruaru

No Alto do Moura, é comum ver meninos e meninas manuseando a argila.
Artesãos sentem-se orgulhosos pelos filhos valorizarem a tradição cultural.



Primos aprenderam a manusear o barro com os avôs. (Foto: Ândrica Virgulino/ G1 Caruaru)Primos aprenderam a manusear o barro com os
avôs. (Foto: Ândrica Virgulino/ G1 Caruaru)
Presenciar crianças brincando com fantoches, carrinhos de mão, bonecas de pano e peteca não é uma cena corriqueira atualmente. Mais raro ainda é ver crianças criando seus próprios brinquedos. E, quando a brincadeira começa por meio da arte de modelar o barro, talvez a cena seja ainda mais incomum. Mas para a comunidade do Alto do Moura, em Caruaru, no Agreste de Pernambuco, é muito natural ver a criançada soltando a imaginação ao manusear a argila.
É o caso dos primos Hortênsia Vitória Rodrigues Nascimento e Luiz Antônio Neto, com 8 e 5 anos de idade, respectivamente. Eles adoram fazer e personalizar os brinquedos que criam. “Aprendi com minha vó Celestina a mexer no barro. Ela me ensinou a fazer panelinhas, xícaras, pratos, canecos. Tudo pra eu brincar de casinha com minhas amigas”, disse Hortênsia. Coelhinhos e sóis são as imagens preferidas de Luiz Antônio. “Já eu aprendi com meu vô Biu. Não sei muita coisa, tô aprendendo. Mas, sei fazer as orelhas do coelhos e o sol bem grande”, conta.
A estudante Ingrid Beatriz Rodrigues, de 7 anos, já demonstra muita habilidade em retratar personagens do cotidiano. “Eu sei fazer as pessoas daqui do bairro, bonecas e flores. Mas o que eu mais gosto de brincar é com a galinha mãe e os pintinhos que eu mesma faço. Ah, eu também adoro pintar”, disse. De acordo com a mãe de Ingrid, a artesã Ivangela Rodrigues, de 27 anos, algumas peças da filha já foram vendidas em feiras de artesanato em Recife. “O avô dela é artesão também e sempre leva as peças que ela faz para as feiras. O povo acha bonito quando sabem que foi uma criança que fez. Por isso, é difícil encontrar alguma peça que ela já tenha feito aqui em casa porque todas acabam vendendo”, conta.
Ingrid Beatriz exibe os pintinhos que ela mesma fez.  (Foto: Ândrica Virgulino/ G1 Caruaru)Ingrid Beatriz exibe os pintinhos que ela mesma fez.
(Foto: Ândrica Virgulino/ G1 Caruaru)
A artesã diz que se sente orgulhosa por ver que a filha gosta de brincadeiras tradicionais, assim como ela o fez na infância, e que Ingrid não faz questão de ter brinquedos que estão na moda. “Acho bonito que ela goste da simplicidade dos brinquedos da nossa cultura e estimule os coleguinhas dela a brincarem junto. É engraçado ver a bagunça que eles fazem aqui em casa com o barro, a água e as tintas. Cada um que queira fazer um brinquedo mais bonito”.
Outra garota que começou a fazer bonecos de barro para brincar quando criança foi a estudante Thaís Rodrigues da Silva. Com 13 anos ela lembra a primeira peça que fez quando ainda tinha 3 anos de idade. "É muito bom pegar no barro, ter contato com a terra. Eu via minha família fazendo as obras e tentava imitar. Minha primeira peça foi uma galinha que eu chamei de 'cocó', nem sabia falar direito", lembra. Desde de 2010 o passatempo de Thaís virou uma profissão bem divertida "Percebi que tinha muitas peças parecidas aqui no Alto do Moura. Daí comecei a fazer porta-lápis em forma de porquinhos. Nesse segmento já tenho mais de quarenta personagens que vão desde Lampião e Maria Bonita até jogador de futebol", diz.
Gosto pelo artesanato em barro influênciou na escolha da profissão. (Foto: Ândrica Virgulino/ G1 Caruaru)Gosto pelo artesanato em barro influênciou na escolha da profissão. (Foto: Ândrica Virgulino/ G1 Caruaru)









A estudante, que também pretende ser arquiteta, disse que seu gosto pelo artesanato em barro teve influência na escolha da futura profissão. "Com certeza essa minha facilidade em fazer objetos, modelar, pintar vai me auxiliar na carreira de arquiteta. É no barro que consigo botar pra fora toda minha criatividade e sentimentos", explica Thaís.
Referência histórica
Um dos maiores incentivadores das crianças do Alto do Moura é o mestre pioneiro Luiz Antônio (o vô Biu, do Luiz) que tem 77 anos e desde os 10 começou a mexer com o barro observando os pais ceramistas. O artesão tem dez filhos e 26 netos, segundo ele, todos estão envolvidos com o artesanato. "Graças a Deus criei todos os meus filhos através da arte. Eles sempre tiveram a liberdade de escolher qualquer profissão, mas estão aqui comigo desenvolvendo e valorizando a arte do barro. Bem assim, eu incentivo meus netos e as crianças da comunidade. Não gosto de ver menino o dia todo na frente da televisão e do celular. Essas tecnologias deixam as crianças esgotadas criativamente", opina.
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Mestre pioneiro da arte do barro é fonte de inspiração para criançada.  (Foto: Ândrica Virgulino/ G1 Caruaru)'Mestre pioneiro' da arte do barro é fonte de inspiração para criançada. (Foto: Ândrica Virgulino/ G1 Caruaru)
Ainda de acordo com o mestre artesão, crescer num bairro como o Alto do Moura rodeado de cultura e de tradição é um privilégio. "Aqui os meninos vivem soltos nos terreiros brincando de bola, amarelinha, ciranda, pega-pega. Aqui todo mundo se conhece e a molecada fica à vontade. A violência está muito grande, mas os pais não podem trancafiar os filhos. Criança tem que saber viver e ser criança", diz o mestre.
Fonte: g1.globo.com

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