domingo, 27 de março de 2016

Olívia Santana: "Combate à corrupção ou assalto à democracia?"

A luta contra a corrupção é justa, toca fundo no sentimento do nosso povo, que ganha a vida honestamente e não quer ser conivente com o saque de suas riquezas. Mas, o que está em curso no país tem outro objetivo: é uma ardilosa tentativa de promover a alteração de forças políticas no poder, sem eleição. 


Por Olívia Santana*


Olívia Santana
Olívia Santana
Hoje, como no passado, quando o caminho foi pavimentado para o golpe militar, investe-se numa crise política que empurra o país para o abismo. Alardeia-se o combate à corrupção, que nada mais é do que um pretexto usado por aqueles que não ganharam a eleição de 2014, para praticar um ato de corrupção ainda mais deletério ao estado democrático e de direito: usurpar o mandato da presidenta da República, Dilma Rousseff, e, numa só tacada, inviabilizar também qualquer possibilidade de retorno de Lula à disputa eleitoral de 2018. É disso que se trata. A oposição não tem projeto que possa encantar a maioria do povo brasileiro. Está cansada de perder e, para não correr mais riscos, busca eliminar seu adversário mais potente.

Não precisa ser de esquerda para lembrar que as eleições que Lula e Dilma enfrentaram foram marcadas por uma forte intervenção da grande mídia, liderada pela Rede Globo, explicitando claramente o seu viés oposicionista! O próprio José Bonifácio, mais conhecido como Boni, ex-diretor da emissora, revelou que o debate entre Collor e Lula, que finalizou a campanha de 1989, foi ardilosamente manipulado para favorecer o primeiro. Armaram uma cena de supostas graves denúncias contra Lula, que seriam comprovadas com fartos documentos contidos em pastas que estavam sobre a mesa do candidato Collor. Disseram ainda que a filha de Lula apareceria a certa altura no programa para denunciar seu pai. As tais pastas tinham apenas papeis em branco e a filha de Lula lá não estava. Era um embuste golpista para atuar no emocional do candidato operário. O resultado, todos conhecem.

Um novo golpe está em curso. Dessa vez muito mais grave. A tentativa de colocar Lula atrás das grades, sem sequer acusação formal e aceita contra ele - agora, parece que já estão tomando as providências nesse sentido -, revela que vivemos uma era de exceção. É com perplexidade que constatamos que parte do Judiciário brasileiro está capturada pela influência dos holofotes midiáticos, que faz inflar carreiras e empresta brilho efêmero a alguns juristas, que deveriam honrar a Constituição, em vez de molestá-la para jogar para a ávida e manipulada plateia.

Parte do PT errou sim, ao sucumbir frente aos esquemas de corrupção sistêmica, que têm raízes sólidas e históricas no sistema político brasileiro. A arrepiante delação de Pedro Correia jogou estrume no ventilador. Atesta ele que o esquema remonta 1980, vem de muito antes de o PT alcançar sua primeira vitória na presidência. Como há uma clara distorção das informações, a maioria das pessoas não sabe, entretanto, que não é essa a sigla com maior número de parlamentares envolvidos no escândalo investigado pela Lava Jato. Sabemos também que, desde o início da era Lula, foi feito todo um investimento no fortalecimento da Controladoria Geral da União, investiu-se mais na Polícia Federal e foram mais valorizadas as instituições de controle do Estado. Todos esses órgãos gozaram e gozam de autonomia jamais vista em nenhum outro governo para agir. Fato ilustrativo são os absurdos grampos ilegais e o vazamento da conversa entre a presidenta e o ex-presidente da República. 

A falsidade do combate à corrupção se evidencia na medida em que mira um só alvo: o PT, ou no máximo alguns de seus aliados. Não é a corrupção que eles querem apurar. É o governo que eles querem derrubar. 

E, contudo, o governo do PT e seus aliados, realizou feitos memoráveis para a sociedade. O Brasil saiu da condição de cadeira cativa no Mapa da Fome da ONU. Sobreleva-se aí o Programa Bolsa Família, mas não só; foi toda uma política de promoção social que criou empregos e valorizou os salários. A propósito, com frequência registram-se críticas despropositadas e injustas, sobretudo ao Bolsa Família. Divulgam, por exemplo, o mesquinho argumento de que as mulheres pobres estão parindo só para receber o benefício do Bolsa Família, o que é uma falácia, ainda mais quando sabemos que a taxa de natalidade brasileira é de 1,8, estando assim entre as menores do mundo. Na mesma linha, caluniam a política de cotas para negros e grupos socialmente vulneráveis nas universidades, mal escondendo a defesa de privilégios, assim como irritam-se contra as garantias trabalhistas conquistadas pelas empregadas domésticas, que na verdade foi um reconhecimento tardio de direitos elementares. Estes, que têm suas vozes pautadas na intolerância, se erguem sob a batuta da mídia, nesse nefasto concerto golpista.

Mas salta aos olhos a parcialidade de setores da Justiça. Aécio Neves foi citado, pelo menos seis vezes na Operação Lava-Jato, mas isso não repercute na mídia e nem nas ações do juiz Sergio Moro. Aliás, tal prática já vem sendo sistemática. Alguém por acaso se recorda do “mensalão tucano”? Nada foi ali apurado, ninguém foi punido. Prescreveu. Também segue o mesmo caminho a Operação Zelotes, que investiga crime de sonegação fiscal da ordem de US$ 20 bilhões! 

É algo infinitamente maior do que o que apura a Lava-jato, e envolve banqueiros e grandes empresas de mídia. E você, que segue na luta, de boa-fé contra a corrupção, sequer percebeu essas coisas. O que a mídia não grita o coração não sente. Fato é que grandes fortunas e grandes afortunados se ergueram saqueando a Nação, e hoje simplesmente se aposentam e continuam a gozar de privilégios sem serem importunados pela Justiça. Tais espólios viram heranças para o desfrute familiar dos que desconhecem o que é o batente honesto; vida que segue... Se o livro A Privataria Tucana fosse sobre o PT, este já seria um partido dissolvido. 

O processo espúrio que foi articulado para resultar no impeachment da presidenta Dilma, parece cena de realismo fantástico! A Comissão montada para tal finalidade tem 61 membros; desses, 36 tem pendências sérias com o judiciário ou com o Tribunal de Contas. É, por exemplo, uma chicana ver Paulo Maluf - que não pode botar o pé fora do Brasil, porque há um mandado internacional de prisão contra ele - e alguns outros da sua estirpe, compondo a Comissão presidida por Eduardo Cunha, decidir o impeachment da presidenta Dilma, que não cometeu nenhum crime de responsabilidade. A suposta ré é muito mais idônea que seus julgadores. Cunha é réu na Lava-jato, mas continua solto por uma única razão: é útil aos que querem a cabeça da presidenta Dilma. O jogo é bruto! Deixemos de lado a ingenuidade. Como disse o grande líder Desmond Tutu: se ficarmos neutros perante uma injustiça, estaremos escolhendo o lado do opressor. Por isso setores cada vez mais amplos passam a perceber o perigo que ronda a nação e começam a se levantar: a CNBB, a SBPC, personalidades e associações de juristas, artistas, os mais diversos movimentos sociais, entre outros, ganham as ruas com mais força e realizam grandes atos contra o golpe que vem sendo orquestrado. Afinal, a Justiça e a democracia são patrimônios dos quais o povo brasileiro não pode abrir mão.

*Secretária Nacional do PCdoB de Combate ao Racismo 
Fonte: www.vermelho.org.br/

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